Alguns Pilares da Espiritualidade proposta por Jesus
O capítulo 23 do evangelho de Mateus é o momento mais
corajoso, duro e instrutivo quanto a espiritualidade de todo o Novo Testamento.
Ninguém que conheço teria o peito que Jesus teve de no ninho das cobras
chama-las de caso perdido. Aqueles homens chamados de fariseus eram
inteligentes, bem sucedidos e respeitados na sociedade a que pertenciam. O que
Jesus fez não tinha nada a ver com “bater em cachorro morto”. Era o amor
selvagem de Deus que tomava a forma de um rebelde divinamente fragilizado em
sua humanidade. Desafio você a ler o texto bíblico juntamente com o texto do
blog. É possível perceber quatro pilares da espiritualidade segundo Jesus em
sua acusação aos fariseus:
1. Encontro pessoal com Deus. A verdade na questão da espiritualidade é algo
que se experimenta. Muitas pessoas já fizeram classe de catecúmenos, mas jamais
tiveram um encontro pessoal com Deus. Alguns teólogos que conhecem as línguas
originais tem contato com a palavra, mas não com a Palavra. Outros gostam muito
de discutir sobre os mais variados temas polêmicos em blogs e afins, mas não
estão determinados a buscar a Deus em oração. E outro são capazes de
participarem de eventos emocionantes mas não de correr riscos pela fé que
professam. A partir daí é possível divisar se temos ou não temos esse encontro.
Assim é que um templo, ou um nascimento cristão não pode me dar essa
experiência. Ela só acontece quando decido me mover em fé diante da Palavra de
Deus a mim. Só conheci ao Deus Provedor quando aceitei correr riscos e abrir
mão da minha segurança. Foi dessa forma que agora sei que “no monte do Senhor
se proverá”. A fé não é um credo apenas, mas uma consciência da presença
de Deus que se move. Já ouvi dizer que o quinto evangelho é escrito com a vida,
com a nossa vida. Ou não.
2. Viver sob princípios, não sob regras. Tem muita gente que acha que a vida da graça é a
vida do “oba oba” e que não tem nenhum compromisso com a atitude e a ética.
Como disse Dallas Willard: “Graça é o oposto de mérito, não de esforço.”
O que acabou levando a essa situação é que gostamos de substituir os
princípios pelas regras. Quando instituímos regras temos a possibilidade de
controlar as pessoas, e driblar os princípios que não gostamos do evangelho.
Quando ensinamos princípios, as pessoas são livres para exercerem sua
responsabilidade diante de Deus. Quando falamos de regras, impomos nossa
interpretação pessoal de algum princípio. Vou usar um exemplo corriqueiro. O
princípio é sermos puros em todas as coisas. Todos na comunidade cristã
concordam com o princípio. Então alguém inventa uma regra que a seu ver aplica
esse princípio: a maneira de vestir. Então se decreta que todos querem ser
puros devem vir para a igreja com cabelo cortado como militar (homens) e saia
abaixo do joelho (mulheres). Então aqui se impõe uma interpretação pessoal do
princípio sobre todos. E então começam os problemas. O primeiro deles é o
espírito de condenação mútua que se estabelece na comunidade. Os que não gostam
da imposição, começam a vigiar os demais e uma cobrança em outras áreas começam
a surgir: a blusa da irmã está decotada demais, a gestante que dá de mamar para
o bebê deveria encobrir mais o seio e então um estado de guerra se estabelece
roubando a vivência de amor que deveria ser a tônica dos relacionamentos. Além
disso, quem quer desobedecer encontra sempre formas de desobedecer. Não existe
comunidade a prova de pecado. Então uma das mulheres da comunidade vem com a
saia abaixo do joelho, mas com um rasgo na lateral que é possível ver toda a
perna! Se instalam então dois movimentos essencialmente nocivos na
comunidade: o espírito condenador e a busca por transgredir aquilo que foi
imposto. Tudo isso deveria nos levar a repudiar qualquer tipo de
espiritualidade que se baseia essencialmente em regras. Mas talvez você pergunte:
Não podemos ter regras? Sim, desde que elas produzam vida e não morte. E isso
cada um de nós tem que avaliar constantemente. Pois como disse John Stott, crer
é também pensar.
3. Simplicidade. Falando
claro: jamais deveríamos buscar qualquer tipo de título dentro da comunidade
cristã. Jamais deveríamos nos impressionar com os títulos de outra
pessoa. Nosso estilo de vida deve ter a marca da acessibilidade. Um
servo não impressiona. Um servo, serve. Quanto maior a hierarquização da igreja,
tanto mais ela se torna uma máquina política. “Não é de personalidades
brilhantes que uma comunidade precisa, mas de fiéis servidores de Jesus e dos
irmãos” escreveu com propriedade Dietrich Bonhoeffer.
4. Transparência. Realizamos um congresso de jovens a algumas semanas
e um dos tópicos foi sobre vícios. Em uma palestra inspirada, minha esposa
expôs o fato de que todos nós carregamos um pendor para algum tipo de vício.
Todos. Logo após fizemos grupos de estudo nos quais a principal atividade era
confessar qual vício nós precisávamos lutar. Foi uma grande dificuldade para
todos romper com aquilo que sabemos se instalou na maioria das
igrejas: a aparência de santidade. A maioria de nós vive preso a
comportamentos viciosos e pecaminosos porque não temos espaço para abrirmos
nosso coração em nossas comunidades sem que as pessoas saiam divulgando
ou assumindo uma pose superior. Como um grupo de viciados, deveríamos ser
capazes de nos solidarizarmos mutuamente e assumirmos nossa necessidade de
ajuda. Na verdade, o que deveríamos disciplinar para o bem da igreja, é a
atitude superior e a fofoca maldosa. Precisamos honrar a transparência,
proteger quem abre o coração, em lugar de expor, condenar e bater em quem já
está quebrado. A transparência mútua fará com que a comunidade viva unicamente
do perdão dos pecados por Jesus.
Portanto,
você que tem sofrido com a igreja. Procure comunidades que em um nível ou outro
expressem como pilares de sua espiritualidade, aqueles que são os pilares de
Jesus. E você que é líder, caminhe nessa direção com coragem, importando-se
mais com a opinião de Deus e menos com a de seus pares.
Kaquinda Dias
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