MÍSTICA
E ESPIRITUALIDADE MISSIONÁRIAS:
(É a partir da experiência de Deus que somos consagrados
e enviados)
O
espírito da Missão hoje, exige que se tenha a consciência do seguimento de
Cristo (sequela Chisti). Como discípulos de Cristo, devemos seguir seu exemplo:
passar no meio deles e ir em frente...
Diante
dos desafios da missão hoje, nossa referência deve ser sempre Jesus que foi desacreditado
por muitos, inclusive por seus seguidores, porém, tinha também aqueles que diziam:
a quem iremos Senhor? Só Tu tens Palavra de vida eterna. O que realmente nos sustenta
na missão é a mística da caminhada, é a espiritualidade missionária que nos ajuda
a criar o verdadeiro espírito que move, motiva e sustenta a missão.
O
título da nossa reflexão é “Espiritualidade e mística….”.
Sempre que
nos deparamos com a palavra espiritualidade e mística, ficamos inquietos e buscamos
de diversas maneiras uma explicação. No entanto, é difícil penetrar no interior
da vida, dos sentimentos e da realidade espiritual da pessoa. Cada um tem uma maneira
própria de demonstrar sua intimidade com Deus. O objetivo desta temática é justamente
oferecer elementos que contribuam para realizar a experiência de Deus, fundamento
próprio da nossa mística missionária.
E isso se
dá no seguimento ao Mestre. A exigência da missionariedade do discípulo decorre
do seguimento de Jesus. O chamamento de Jesus apresenta a exigência de estar com
Ele e vincular‐se à sua missão, enquanto chamados e enviados. A parábola
da videira e os ramos mostra que Jesus não quer uma vinculação como servo, mas como
amigo (Cfr Jo 15,1-8) e irmão (participando da vida do Ressuscitado). A resposta
ao seu chamado exige entrar na dinâmica do Bom Samaritano, com o imperativo de fazermo‐nos próximos,
especialmente dos que sofrem (Cfr. Lc 10,29-37).
O chamado
de Jesus e seu olhar amoroso buscam suscitar uma resposta consciente e livre de
discípulo e a adesão a Ele, e de toda a sua pessoa. É uma resposta de amor a quem
o amou primeiro, até o extremo.
O Espírito
Santo identifica‐nos com Jesus‐Vida, ajudando‐nos a abraçar o plano de amor do Pai.
Ao chamar
os discípulos, Jesus lhes dá uma missão: anunciar o Evangelho do Reino a todas as
nações. Por isso todo discípulo é missionário. Cumprir essa missão não é uma tarefa
opcional, mas integrante da identidade cristã. A missão consiste em partilhar a
experiência do acontecimento do encontro com Jesus Cristo, testemunhá‐lo e anunciá‐lo de pessoa
em pessoa, de comunidade em comunidade e da Igreja aos confins do mundo. Tudo isso
se dá a partir do encontro com Jesus, da experiência de Deus em nossa vida. No entanto,
como já falei anteriormente, cada um tem uma maneira própria de demonstrar sua intimidade
com Deus.
1. Trata‐se de fazer a Experiência de
Deus
“Experimentar
Deus não é pensar sobre Deus, mas sentir Deus com toda a totalidade de nosso ser.
Experimentar Deus não é falar de Deus aos outros, mas falar a Deus junto com os
outros” (L. Boff).
A experiência
de Deus não pode ser um momento de particular iluminação que resolve e esclarece
tudo de uma só vez. Ela vai se manifestando nos fatos da vida. É um caminho que
avançamos passo a passo, fazendo sempre novas descobertas aprofundando a própria
vocação e missão. Os acontecimentos especiais da vida revelam o ponto de partida,
para percorrer novos caminhos. Esses caminhos aparecem no empenho que mantemos a
serviço do povo de Deus.
O chamado
continua a se fazer ouvir por meio da nossa sensibilidade às necessidades dos irmãos.
Vem através de pessoas, homens e mulheres, todos sacramentos vivos do Deus que ama
e que chama. Na fidelidade à missão, cresce a alegria pelo caminho que se percorre
(aqui cai bem lembrar Dom Pedro Casadáliga quando diz: “se sou batizado devo ser
missionário, se não sou missionário, não sou cristão”. Ou Dom Zacarias
Kamwenho, “o evangelizado evangeliza”.
Cada um
é chamado na realidade em que se encontra. Este convite é sempre um êxodo para viver
a fé, no seguimento de Cristo.
O Senhor
chama pessoas que manifestam inquietude diante da realidade sofrida que vive o povo
de Deus. É o que vemos na Bíblia. Moisés, antes do encontro com a Sarsa Ardente,
já tinha dado sinais de estar sensível às situações de escravidão que seu povo vivia;
já o vemos antes, intervindo em favor de um irmão oprimido (Ex 2,12) e defendendo
as filhas de Jetro (Ex 2, 17).
1.1 Rompendo Paradigmas
Atualmente,
muitas pessoas, mudam seu projeto de vida, rompem antigos paradigmas para responder
aos apelos de Deus (e nós padres?).
Apelos que
nascem das situações de miséria e injustiça. São questões ligadas diretamente do
confronto da própria consciência com a Palavra de Deus. (Jo 1,1ss).
Para os
cristãos, a experiência de Deus deve ser um apelo à solidariedade, que tem de
ser vivida profeticamente em comunidade, uma comunhão com os filhos de Deus. Nesta
comunhão, a Trindade é vista como a imagem daquilo que somos chamados a realizar
(a ser).
Sabemos que somos à imagem e semelhança de Deus,
e Deus é Trindade. Portanto a solidariedade tem de ser uma privilegiada porta de
entrada. O amor de Deus se torna concreto na experiência de servir os injustiçados.
Então podemos dizer como os cristãos da comunidade de João: “o que nós vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que
também vós estejais em comunhão connosco. E nós estamos em comunhão com o Pai e
com seu Filho, Jesus Cristo”. (1Jo 1,3).
A fé cristã
é, portanto, no seu aspecto histórico, a experiência de Deus transmitida através
das gerações. Entramos nessa história salvífica, atualizando em nós, a experiência
da graça de Cristo, vivenciada pelos primeiros discípulos. (Kayros).
A experiência
da salvação e da renovação cristã deve ser oferecida a todos, para não acontecer
rupturas na concretização do projeto de Deus. Isso se dá, porque o nosso Deus é
por excelência contemplação.
São Paulo,
quando escreve aos Coríntios (Cor 15,1‐11), mostra que a intimidade com Deus, transforma a vida das pessoas.
A experiência de Deus se dá na alegria, na dor, no sofrimento... Mas é da cruz que
brota a vida nova. Para isso, é necessário estarmos abertos à graça, mantendo docilidade
a ação do espírito Santo. (RM 87).
A experiência
de Deus é como eixo de uma roda. Ele é centro de sustentação da roda. Assim é a
espiritualidade. Ela anima, sustenta, mantém viva e atualizada a nossa missão.
2.Mística e espiritualidade missionária
2.1 Mística
O mundo
em que vivemos sofre transformações constantes. O ser humano vive ameaçado por idéias
incompatíveis com o projeto de Deus (neoliberalismo, globalização...) e sofre interferências
que nem sempre respondem aos seus anseios e expectativas.
É nesse
sentido que podemos falar de convicção cristã. Dela nasce a mística da nossa missão.
A mística não se compra em farmácia como medicamentos, mas se adquire através da
sintonia com Deus, no silêncio e na partilha, em comunhão e solidariedade com a
caminhada do povo. Mística é algo invisível. Não se vê, não se toca, mas se experimenta.
É uma experiência muito importante. É como o ar que respiramos. É como as raízes
de uma planta, não aparecem, mas sustentam a vida.
Mística
não é uma palestra sobre assuntos religiosos, catequese, curso bíblico... É algo,
profundamente existencial: tem a ver com nossos anseios, nossos sonhos e frustrações.
Está ligada à nossa presença neste mundo e, ao mesmo tempo, à nossa sede de absoluto,
do eterno. Alcança o íntimo do nosso ser. Mexe com emoções, sentimentos, atitudes,
opções... Tem a ver com as raízes da nossa vocação cristã, a nossa vocação missionária.
E que passa pela fé nos transmitida por nossos pais.
Mística
cristã é algo que se experimenta e se vive diariamente. É uma relação profunda,
com o amor misericordioso do Pai (Lc 12), com a pessoa de Jesus Bom Pastor (Jo 10)
e verdadeira videira (Jo 15), com a força e o calor do Espírito Santo (Jo 20, 21‐23: Actos 1,8).
Para Jesus,
a mística era um encontro profundo e íntimo com o Pai: “eu estou no Pai e o Pai
está em mim” (Jo 14, 11). “Eu e o Pai somos um” (Jo 10, 30). “O meu alimento é fazer
a vontade daquele que me enviou a realizar a sua obra” (Jo 4, 34).
Para o Apóstolo
Paulo a mística era profunda comunhão com a pessoa e a prática de Jesus. “Para mim
o viver é Cristo” (Fl 1, 21).
Mística
e missão são inseparáveis. Marcam a unidade e a profundidade do amor de Deus com
a vida humana, levando a um engajamento gratuito e eficaz em favor da vida. A falta
de engajamento eficaz, gratuito, fiel, permanente, verdadeiro e libertador têm a
ver com a ausência de mística. A crise é crise de mística. Os profetas, todos eles,
foram místicos e missionários ao mesmo tempo.
Jesus, que
viveu uma comunhão íntima com o Pai, foi por excelência o missionário da vontade
do Pai. Ele era o enviado do Pai, para pregar a Boa Nova (Mc 1, 38‐39). “o espírito do senhor está sobre
mim... para anunciar a Boa notícia aos pobres, enviou‐me para proclamar o ano da graça...
a libertação aos presos...” (Lc 4, 18‐21).
Aos fariseus
e doutores da lei, que criticavam suas ações, Jesus responde dando razões de sua
missão, através de três parábolas. Estas, falam do amor carinhoso e misericordioso
do Pai para com os últimos, os marginalizados. (Lc 15, 1‐32). (Parábola da ovelha perdida,
a moeda perdida
e o filho pródigo).
O que dizer
da conversão de Paulo, da sua experiência mística com Jesus, que se revelou na carne
sofrida e machucada dos cristãos perseguidos por ele mesmo?
Paulo começa
a pregar nas sinagogas, afirmando que Jesus é o Filho de Deus (At 9, 20). Às comunidades
da Galácia diz: “Não sou mais eu que vivo, mas Cristo é que vive em mim” (Gal 2,
20). Para os Coríntios Paulo gritava: “Ai de mim se não anunciar o Evangelho!” (1Cor
9, 16).
Missão,
portanto, não é luxo, não é tarefa de um grupo escolhido (amiguinhos). Missão verdadeira
nasce do Batismo, profundamente enraizado na pessoa de Jesus Salvador e Libertador.
Missão é questão de amor. A experiência do amor faz sair de si para ir ao encontro
do outro. Gera verdadeiro sentido da vida e vida plena, como Jesus: “Eu vim para
que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10). Nós como missionários,
só conseguiremos entender a proposta de Jesus, através da nossa intimidade com sua
palavra, uma das maneiras que favorecem o encontro com Cristo.
A primeira
carta de João diz: “O que nós ouvimos e vimos com nossos olhos, o que contemplamos,
o que nossas mãos apalparam, a Palavra que é vida....nós agora anunciamos a vocês...”
(1Jo 1, 1‐4).
Isso é mística de primeira qualidade!
Ouvimos
bem, a Palavra é vida. Porém, esta vida está sendo ameaçada. A sociedade nos apresenta
de modo geral, um anti‐projeto, o contrário do Projeto de Deus. Diante disso, devemos partir
sempre, a exemplo do
Vaticano II, dos sinais dos tempos, presentes em uma realidade ambígua e contraditória.
É
evidente que as condições de vida dos milhões e milhões de abandonados, excluídos
e ignorados em sua miséria e sua dor, contradizem o projeto do Pai e desafiam os
cristãos a um compromisso em favor da cultura da vida.
Isso é demanda para nossa atividade
missionária.
A concluir podemos dizer que
precisamos de nos abastecer para podermos funcionar, partilhar e promover.
KD
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