O RICO E O POBRE LÁZARO
Jeremias 17,5-10 - Jeremias oferece-nos
duas sentenças sapienciais. Servindo-se da contraposição, aponta claramente
onde está, para o homem, a maldição cujo resultado é a morte (vv. 5- 8), e onde
está a bênção cujo resultado é a vida. O ímpio é aquele que, ainda antes de
praticar o mal, apenas confia no que é humano e se afasta interiormente do
Senhor. O resultado só pode ser a prática do mal. Aquilo em que o homem põe a
sua confiança é como o terreno donde uma árvore retira o alimento. Por isso, o
ímpio é comparado a um cardo do deserto que não pode dar fruto nem durar muito
(v. 6). O homem piedoso também se caracteriza, em primeiro lugar, pela sua
atitude de confiança diante de Deus. Por isso, é comparado a uma árvore
plantada junto de um rio: não há-de morrer de sede, nem será estéril (vv.
9ss.).
Na segunda sentença, o
profeta insiste na importância do «coração», centro das decisões e da
afectividade do homem. Só Deus experimenta e avalia com justiça os
comportamentos e os frutos de cada um dos homens, porque, só Ele conhece de
verdade o coração do homem e o pode curar.
Lc 16,19-31 - S. Lucas recolhe, no
capítulo 16 do seu evangelho, os ensinamentos de Jesus sobre as riquezas. A
parábola, que hoje escutamos, ensina-nos a considerar a nossa condição actual à
luz da condição eterna. A sorte pode inverter-se. E seguem algumas aplicações
práticas (v. 25). Jesus fala-nos de um homem rico que «fazia todos os dias
esplêndidos banquetes» e de um pobre significativamente chamado Lázaro (termo
que significa Deus ajuda). Atormentado pela fome e pela doença, permanece à
porta do rico, à espera de alguma migalha. Os cães comovem-se com Lázaro; mas o
rico permanece indiferente.
Chega porém o dia da
morte, a que ninguém escapa. E inverte-se a situação.
Jesus levanta um pouco
o véu do tempo para nos fazer entrever o banquete eterno, anunciado pelos
profetas. Lázaro é conduzido pelos anjos a um lugar de honra, nesse banquete,
enquanto o rico é sepultado no inferno. Do lugar dos tormentos, o rico vê
Lázaro e atreve-se a pedir, por meio dele, um mínimo gesto de conforto (v. 24).
Mas as opções desta vida tornam definitiva e imutável a condição eterna (v.
26). Nem o milagre da ressurreição de um morto, diz Jesus, aludindo a Si mesmo,
podem sacudir um coração endurecido que se recusa a escutar o que o Senhor
permanentemente ensina por meio das Escrituras (vv. 27-31).
Hoje, tanto a primeira
leitura como o evangelho, com imagens muito simples mas pintadas a cores
fortes, nos colocam perante o facto de que é nesta vida que decidimos o nosso
destino eterno, a vida ou a morte, sem outras possibilidades. Aquele que, nesta
vida, põe a sua confiança nos meios humanos e nas coisas materiais e,
sobretudo, aquele que se afasta do Senhor, e organiza a própria existência
independentemente de Deus, é «mediatista». O apego a uma felicidade egoísta
leva à cegueira, que não permite ver para além do imediato, do material. Não
permite ver a Deus, nem a caducidade da nossa atual condição, como não permite
ver as necessidades dos pobres que jazem à nossa porta. Aquele que confia no
Senhor, reconhecendo a sua condição de criatura, dependente e amada por Ele, é
«bendito», Leva no coração uma semente de eternidade que florescerá em
felicidade e paz eternas. Por outro lado, a verdadeira confiança em Deus é
sempre acompanhada pela solidariedade com os pobres, com pobres que o são
materialmente, com os que o são espiritualmente, mas também com os doentes, com
vítimas de contrariedades e opressões de qualquer espécie. Tanto Jeremias como
Jesus nos ensinam tudo isto, não de modo abstrato, mas com imagens expressivas
como a da árvore plantada no deserto ou junto de um rio ou como o pobre Lázaro.
O pobre Lázaro
caracteriza-se pelo silêncio, tanto diante das provações da vida como diante da
falta de atenção daqueles de quem esperava ajuda. Não grita contra Deus nem
contra os homens. Permanece silencioso e paciente no seu sofrimento físico,
psicológico e espiritual, confiando em Deus. Finalmente surge a morte e tudo se
transforma. Levado pelos anjos para o seio de Abraão, continua em silêncio. No
seu rosto, primeiro sereno e confiante, e agora glorioso, transparece outro
Rosto, o de Jesus, que se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza.
Sendo de condição divina, por nosso amor, assumiu a condição humana, para que
pudéssemos participar da sua condição divina. Sendo rico fez-Se pobre, homem
pobre, para que todos pudéssemos participar da sua riqueza.
A nossa confiança em
Deus leva-nos a solidarizar-nos com o amor de Jesus por todos os homens, um
"amor que salva". Como Ele, queremos estar presentes e atuantes junto
de todos os lázaros desta humanidade de que somos parte. Queremos viver e atuar
unidos "no seu amor pelo Pai e pelos homens", especialmente pelos
"pequenos" e pelos "pobres", porque "Cristo se
identificou" com eles (cf. Mt 25, 40). Esta é a primeira, boa nova (cf. Lc
4, 19) porque os quer libertar da sua opressão, sofrimento, pobreza. Porque os
quer felizes, é para eles a primeira bem-aventurança: "Bem-aventurados os
pobres, porque deles é o Reino de Deus' (Lc 6, 20) e o Reino de Deus é, antes
de mais, Jesus pequeno e pobre, que quer elevar todos "os pequenos ... os
pobres" a "pobres em espírito' (Mt 5, 3), onde a pobreza nem sequer
já é uma desgraça, onde, mais do que a carência de bens materiais, é realçada a
mansidão e a humildade de coração, a confiança, o abandono à vontade de Deus,
dando espaço a Jesus, para que viva a Sua pobreza na nossa pobreza.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.