Pasárgada

…Cheguei no momento da criação do mundo e resolvi não existir. Cheguei ao zero-espaço, ao nada-tempo, ao eu coincidente com vós-tudo, e conclui: No meio do nevoeiro é preciso conduzir o barco devagar.


Serei o que fui, logo que deixe de ser o que sou; porque quando fui forçado a ser o que sou, foi porque era o que fui.

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terça-feira, 10 de janeiro de 2012


O PENSAMENTO KANTIANO E SUA FILOSOFIA CRÍTICA I
Com este título, queremos aqui dar uma vista de olhos à Obra de Kant, apresentando as indeias principais que ele nos deixou, contextualizando-as na história da Filosofia Ocidental. É extrato de um texto resultante de pesquisas e reflexões que temos feito sobre a herança filosófica que Kant nos deixou.
Falando de filosofia crítica kantiana estamos em sua arquitetônica filosófica – as chamadas Críticas (Crítica da Razão Pura, Crítica dos Costumes e Crítica do Juízo).
Devemos considerar, desde início que a Obra de Kant, geralmente, é dividida em duas grandes fases, a primeira, chamada Pré-Crítica, que vai de 1755 a 1770, e a segunda de Criticismo, de 1781 até 1790. Na fase pré-crítica, Kant debate todo tipo de tema, indo desde a teoria do céu - História Universal da Natureza e Teoria do Céu, publicado anonimamente em 1755 – até os silogismos de lógica clássica – Acerca da Falsa Sutileza das Quatro Figuras do Silogismo (1762). Aqui, não há ainda uma organização sistemática dos conceitos e idéias trabalhados. Mas já podem ser notadas noções que serão mobilizadas e sistematicamente agrupadas, mais tarde. A partir de sua famosa Dissertação de 70, ou Acerca da Forma e dos Princípios do Mundo Sensível e do Mundo Inteligível, Kant lança a linha de pesquisa e os conceitos principais que orientarão o plano arquitetônico de sua fase crítica, ao mesmo tempo em que conseguia uma almejada colocação na Universidade de Koenigsberg.
Durante os onze anos que se seguiram, monta então um método de análise das questões metafísicas que só terá seus alicerces expostos por inteiro na primeira crítica, a Crítica da Razão Pura (1781, doravante CRP). Com CRP, fica estabelecida a divisão fundamental das faculdades do pensamento em três partes: conhecimento, juízo e razão. O conhecimento da natureza objetiva das coisas é tratado pela própria CRP. A razão e suas idéias de liberdade e vontade boa são abordadas na Crítica da Razão Prática (1788). À Crítica da Faculdade de Julgar(1790, doravante CJ), restou o tratamento dos limites da formação de proposições técnicas e da arte, ao realizarem um fim na natureza.
Em sua fase crítica, Kant escreveu vários outros opúsculos – de "O Que é Esclarecimento?", de 1783, até Lógica (1800) - que preparavam a passagem de uma etapa da crítica para outra; divulgava os pontos principais de seu método; além de debater as disciplinas da história, do direito, política, educação, religião, antropologia e lógica, sempre sob a ótica do criticismo.
Os textos de Kant diretamente relacionados com a arte são o opúsculo pré-crítico“Observações sobre o Sentimento do Belo e do Sublime” (1764) e a Crítica do Juízo (CJ). Porém, a CRP traz definições importantes acerca do conceito de estética e do papel da imaginação que, se forem ignoradas, podem gerar interpretações equivocadas em relação à sua concepção de arte. Em Observações, são relacionadas várias noções, hipóteses e exemplos de sentimentos de gosto e moral. O texto carece de definições mais precisas. As duas primeiras seções esboçam uma teoria do gosto e da moral, enquanto as terceira e quarta seções traçam uma visão antropológica dos caracteres humanos, a qual foi alvo de ataques das feministas, no século XX. Contudo, sua leitura serve como roteiro inicial dos conceitos e idéias que serão melhor trabalhados na CJ. São visíveis as influências dos filósofos escoceses, o que lhe valeu a alcunha de “Hume prussiano”. Em suma, são os projetos de uma futura crítica da razão prática e do gosto que se encontram ali.
Na "Estética" e na "Lógica Transcendental", que subdividem a CRP, há uma definição de estética, como forma da sensibilidade, que difere radicalmente do uso comum do termo lançado por Baumgarten. Para Kant, os juízos relacionados à arte dizem respeito à faculdade do juízo e formação do gosto (teoria da arte, como técnica de realização de um fim da natureza). Por outro lado, a estética kantiana visa definir os limites da sensibilidade na forma dos conceitos de espaço e tempo, que antecedem a toda experiência sensível. Além disso, a CRP faz a classificação das faculdades mentais; da imaginação, razão, entendimento e sensibilidade, bem como as definições conceituais que servem de base a todo sistema kantiano, incluindo a CJ.
Na CJ, essas classificações reaparecem ao mesmo tempo em que se busca apontar a finalidade da natureza humana, antecipando a resposta à pergunta “o que é o homem?”, que só aparecerá publicada na Lógica. Tal como nas Observações, é um passo para sua antropologia filosófica, mas agora sistemático e consistente. Aqui, se encontram as limitações de universalização dos juízos de gosto, em seu lugar sendo postulada, entretanto uma generalização argumentada. É o famoso conflito entre objetividade e subjetividade que atravessa toda arte moderna. A solução recairá sobre a tentativa de consenso. Um achado que influenciará Hannah Arendt (1906-1975) e Juergen Habermas dois séculos depois. Também é discutido o papel dos interesses e definidos o belo e o sublime. Por fim, há uma caracterização do gênio artístico que incendiará as mentes de Hegel e Schopenhauer, forjando todo movimento romântico do século XIX.
Observações e Primeira Crítica
Embora as Observações sejam consideradas obra da juventude de Kant, o fato é que seu autor já completava 40 anos na época de sua publicação. A razão pela qual não se permite incluir os artigos deste período entre os textos maduros decorre do método rigoroso estabelecido pelo próprio Kant para expor seu pensamento, após a Dissertação de 70. Por conta disso, os títulos anteriores a 1770 são geralmente caracterizados como assistemáticos e carentes de definições mais precisas em vários campos.
Contudo, autores, como Hannah Arendt, chamam atenção para a importância desses pequenos ensaios iniciais quando se trata de interpretar os últimos textos da fase crítica ou os temas que só foram abordados em pormenor no final da vida de Kant, afetada aqui e ali pela senilidade. As questões ligadas à arte estão entre aquelas atingidas por essas circunstâncias. Depois das Observações, Kant só veio trabalhar diretamente o assunto em 1790, com a publicação de CJ, sua terceira e última grande obra crítica.
As Observações são ainda marcadas pela influência do conceito de benevolência de David Hume (1711-1776), bem como todas as teorias sobre o sentimento moral debatidas desde o lorde e filósofo inglês Anthony Ashley Cooper (terceiro conde de Shaftesbury, 1671-1713), autor de Investigações sobre a Virtude (1699), até o filósofo e economista escocês Adam Smith (1723-1790) - Teoria dos Sentimentos Morais (1759). Kant ainda se percebia próximo às origens escocesas de sua família, a ponto de ser chamado de “Hume prussiano” pelo teólogo alemão Johann Georg Hamann (1730-1788), um conterrâneo seu. Não obstante, na passagem para o criticismo, toda essa presença dos sentimentos morais será minimizada em função dos ditames da razão. É só no final da Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785) que haverá uma ligeira retomada dos sentimentos como motivação relevante para moralidade [1], mas que logo se desfaz com o lançamento da Crítica da Razão Prática (1788), onde perdem lugar em definitivo para o faktum da razão.
Nas Observações, as concepções de arte estão misturadas com moral, antropologia e mesmo com política – caso se aceite a tentativa de Arendt resgatar aspectos sociológicos em Kant, desde a fase pré-crítica [2]. Para quem pretende investigar a teoria da arte kantiana, entretanto, faz-se necessário procurar refinar suas primeiras concepções sobre o tema, a fim de evitar distorções na leitura posterior dos mesmos conceitos na CJ. Além do mais, tratam-se de meras observações ou descrições e não de argumentação ou justificação filosófica.
Ao longo das três críticas, as faculdades mentais humanas foram sendo criteriosamente classificadas. A CRP procurou delimitar o alcance da razão, enquanto buscava um fundamento seguro para a produção do conhecimento racional. A Crítica da Razão Prática expôs a faculdade da razão prática e sua capacidade de formular leis que orientassem a ação humana. Por fim, a CJ visou apresentar o método de subsunção dos conceitos aos fenômenos e a consequente formação de juízos de avaliação, incluindo o gosto artístico.
Observações de um Filósofo
Logo no primeiro parágrafo do ensaio de 1764, as sensações de prazer são consideradas atributos próprios dos seres humanos, um sentimento que lhes seria interno, e nunca o efeito de uma característica qualquer das coisas externas. Com isso, Kant descartava de imediato toda teoria das formas platônicas que colocasse a beleza em um mundo harmônico ideal, completamente independente do sujeito. Porém, ao propor critérios de avaliação de modo subjetivo, um velho problema ressurge toda vez que se postula valores artísticos objetivos perante outro sujeito. Só depois de descartadas as soluções sentimentalistas dos escoceses, um quarto de século mais tarde, é que tentou Kant resolver a questão da objetividade apelando a uma solução de compromisso pela plausibilidade, através de um consenso discursivo, na CJ.
Enquanto essa resposta comunicativa não vinha, a universalização dos valores, em arte, seguiu a sugestão de Francis Hutcheson (1694-1746), Hume e outros que defendiam sentimentos naturais partilhados pela maioria da humanidade, sem mais se argumentar em favor de critérios tão subjetivos. Subjetividade, aliás, que seria uma constante em toda arquitetônica kantiana. Assim, nas duas primeiras críticas, o fato da racionalidade passará a ser suficiente para garantir a objetividade do conhecimento e deveres morais impostos pela faculdade da razão. Já na terceira crítica, por se tratar do gosto, o apelo a uma faculdade de julgar não será o bastante para apontar um objeto ou juízo valorativo capaz de ascender a universalização, sem a observância de uma finalidade na natureza (teleologia), ou pelo menos um consenso argumentado.
Antes de chegar a essa conclusão, nas Observações, Kant expõe apenas o ponto de vista de um observador comum que se abstém de argumentar como filósofo ao descrever o sentimento do belo e do sublime. À primeira vista, percebe-se, no entanto, que os candidatos ao gosto refinado precisam atender a certos requisitos, como, por exemplo, estar o mais distante possível das inclinações [3]. Os sentimentos do belo e do sublime teriam por função proporcionar sensações para coisas agradáveis e leves; bem como para objetos imponentes e intensos, respectivamente. Ou seja, para fruição da beleza e contemplação do sublime. Esses sentimentos, por sua vez, estariam relacionados a três temperamentos típicos: o melancólico, o sanguíneo e o colérico, sendo os fleumáticos considerados completamente destituídos de sentimentos morais.
A partir da segunda seção, o entendimento é posto ao lado das coisas sublimes, enquanto as habilidades práticas são vinculadas ao belo. Estas e outras tantas classificações arbitrárias implicariam também na possibilidade de se considerar belos e sublimes aspectos contraditórios, viciosos e a fraqueza moral, ressalvadas as deliberações da razão em contrário. Nesses casos, fica flagrante alguma dose de relativismo nas definições do gosto que Kant não tenta refutar àquela altura, nem explicar [4]. Mas fica também evidente que uma atribuição superficial do belo e do sublime pode ser feita sempre que esta for calcada em aparências ou condição social, nas deliberações sobre o assunto.
Para haver um equilíbrio nas ponderações, é preciso que se recorra a uma harmonia nas proporções que seja própria à natureza humana [5]. Nesse sentido, sempre que se seguisse princípios adequados poder-se-ia chegar ao sublime. Porém, as virtudes que conduzissem ao cumprimento do dever e à inclusão universal da humanidade seriam pertinentes ao sublime. Surge aqui, então, a necessidade básica de se encontrar regras restritivas das ações e das influências das inclinações, no intuito de permitir o florescimento da verdadeira virtude (amor universal pela humanidade - [6]).
Moral e arte misturam-se em função da dignidade humana, orientando as escolhas que considerem os interesses de todos. Tais sentimentos sublimes seriam encontrados em pessoas com caráter melancólico. Ao passo que, os sanguíneos e os coléricos tenderiam ao belo. Já os fleumáticos seriam desprovidos de sentimentos refinados.
Em suma, as duas primeiras seções das Observações mostram, em geral, que, para se alcançar o sublime, alguns elementos críticos sugeridos são necessários, tais como conexões entre as sensações e o entendimento, vinculação a princípios, universalização dos interesses, restrições às inclinações e um projeto da natureza para os seres humanos.
O Conceito de Estética
A sistematização de todas essas concepções começa a partir da CRP. O plano arquitetônico esboçado por Kant obrigou, entretanto, que se rejeitasse as iniciativas pioneiras de Alexander G. Baumgarten, sobretudo no que dissesse respeito ao conceito de estética. Em sua obra monumental Aesthetica (1750/58), Baumgarten havia proposto uma definição para o termo “estética” como a ciência das coisas sensíveis, incluindo aí a faculdade de julgar e a possibilidade de se chegar ao aperfeiçoamento do conhecimento sensitivo [7].
Kant opôs-se a esse projeto e, na CRP, restringiu o uso do termo “estética” apenas à consideração das formas da sensibilidade, única parte da crítica do gosto digna de ser considerada científica, isto é, capaz de contribuir para formação das leis a priori do conhecimento, em geral. Quanto à faculdade de julgar, ou o Juízo, caberia ainda um lugar de destaque na Crítica, mas a análise completa dedicada apenas ao gosto só apareceria na publicação da CJ, nove anos mais tarde.
O objetivo de Kant na primeira crítica era encontrar uma base sólida para a metafísica, ou do conhecimento filosófico puro. Kant pensava que a física, a matemática e a geometria de seu tempo já haviam encontrado formas de conhecimento que satisfizessem seu estatuto científico, enquanto a metafísica não era capaz de fornecer, sequer, um juízo sintético a priori. Com isso, Kant queria dizer que para uma atividade ser considerada científica era preciso que esta apresentasse proposições, ou enunciados, que fornecessem informações adicionais sobre o sujeito estudado e, além disso, que transcendessem a qualquer experiência, isto é, que fossem entendidas sem o recurso das relações aparentes das coisas materiais, mas passíveis de universalização. Tal juízo deveria estar livre do contato com a experiência, para ser um instrumento preciso da razão humana. A posse de um conhecimento puro seria importante para qualquer ciência, uma vez que tal conhecimento garantiria a sua necessidade e fundamentação para suas hipóteses.
Todas as ciências teóricas - a matemática, geometria e a física -, imaginava Kant, teriam juízos sintéticos a priori como seus princípios fundamentais, caberia agora à metafísica encontrar seus princípios sintéticos uma vez que ela teria como fonte apenas o conhecimento puro a priori. O passo seguinte para solucionar esse problema seria descrever a estrutura da razão que produz tais juízos. Na "Doutrina Transcendental dos Elementos", primeira divisão da CRP, Kant apresentou em primeiro lugar uma "Estética Transcendental", onde mostrava os princípios da sensibilidade a priori. A sensibilidade, nesse sentido, seria a capacidade de receber representações dos objetos percebidos. Através da sensibilidade os objetos são dados e a intuição empírica é fornecida, de acordo com as sensações provocadas pelos objetos. Os objetos da intuição empírica são chamados fenômenos. Os conceitos relativos aos fenômenos são gerados pelo entendimento, tendo por base apenas as intuições da sensibilidade. Além das intuições empíricas, a sensibilidade forneceria as intuições puras como formas próprias, não dependentes de um objeto real dos sentidos, mas a condição para que estes sejam percebidos em sua figura e duração. Tais intuições puras a priori seriam o sentido externo do espaço, onde os objetos são representados como sendo do lado de fora do sujeito, e o sentido interno do tempo que representa dentro do sujeito a sensação de passagem ou permanência de um objeto. Tempo e espaço não seriam conceitos empíricos, mas a condição da sensibilidade para que a experiência se tornasse possível, portanto, antecedendo a esta.
Logo, na Estética Transcendental, a sensibilidade ocupa um lugar central como a faculdade receptiva das representações em seu contato com o mundo empírico. Destarte, produziria intuições que depois de serem sintetizadas pelo entendimento, gerariam conceitos sensíveis ou puros. Quando puras, as intuições corresponderiam às formas da sensibilidade que abrem passagem para as coisas externas e internas, por meio do espaço e do tempo, respectivamente. Estes são os principais conceitos da sensibilidade, existentes antes de qualquer experiência (a priori), que autorizam conceber a estética transcendental como uma ciência da faculdade representativa, tal como Kant entendia as ciências, no lugar da estética geral, ou crítica do gosto, que ele criticava em Baumgarten.
A Faculdade de Julgar
Depois disso, restaria detalhar como o entendimento produz as representações e o conhecimento daquilo que é percebido pela sensibilidade. A Lógica Transcendental vem determinar a origem e o alcance desses conhecimentos. Na estética, Kant concluiu que só é possível ter intuições sensíveis e que as supostas intuições puras, nada mais são que as formas puras da sensibilidade - espaço e tempo - que permitem a percepção externa e interna dos objetos. Assim, apoiado em intuições sensíveis o entendimento deveria pensar os objetos, a fim de gerar o conhecimento, pela união da intuição com o pensamento. Não obstante, para que fosse um conhecimento puro conveniente à metafísica, a lógica transcendental deveria analisar também se existe algum conceito realmente puro e independente da sensibilidade. Caso houvesse, esse conhecimento oriundo de idéias transcendentais seria o objeto adequado da razão pura.
A Lógica Transcendental, em resumo, estaria voltada para o estabelecimento de regras do entendimento e a consequente formação do conhecimento. Além disso, nesta parte seria feita a análise geral da imaginação e da faculdade de julgar, em geral, mas que são também pertinentes à teoria da arte. Ao tratar da imaginação [8], Kant lhe atribui um papel importante, pois, uma vez que o sujeito atinja a unidade sintética da apercepção – a consciência de si mesmo como um Eu capaz de garantir objetividade as suas formas de pensamento (categorias de quantidade, qualidade, relação e modalidade) -, nela seriam formados esquemas dos objetos e do próprio sujeito consciente que proporcionariam ao juízo relacionar os conceitos gerados pelo entendimento aos fenômenos. A imaginação poderia fazer representar os diversos objetos, mesmo sem estes estarem presentes na intuição sensível. O entendimento só seria capaz de fazer a síntese intelectual do conhecimento a priori. Para fazer a síntese figurada da diversidade dos objetos seria preciso, então, a participação da imaginação.
Neste ínterim, a função da faculdade de julgar estaria em ligar os esquemas da imaginação produtiva com os fenômenos, subsumindo-os às regras fornecidas pelo entendimento. Nesta tarefa, o Juízo dependeria tão somente do “bom senso”, uma prática que não pode ser ensinada, por se tratar de um dom natural de cada um [9]. Graças ao Juízo, o entendimento poderia operar os esquemas e chegar ao conhecimento fenomenal, relacionando-os, por sua vez, com as categorias engendradas pelo sentido interno na síntese do sujeito. Por fim, os objetos passariam a fazer sentido e o universal poderia ser vinculado à experiência, embora o conhecimento da coisa em si, continuasse sempre inacessível aos humanos.
No restante da CRP, Kant se esforçou em demonstrar as limitações da razão pura ao estabelecer seus raciocínios e idéias transcendentais, enquanto tentava expor as dificuldades da mente humana em resolver os problemas (antinomias) inerentes à existência de objetos simples ou compostos; às idéias psicológicas, da existência da alma ou de sujeitos absolutos; cosmológicas, sobre a origem e infinitude do universo; e teológicas, existência de um ser supremo. Assuntos que não estão diretamente ligados à teoria da arte, mas a do conhecimento. A antinomia que diz respeito aos juízos estéticos se refere à necessidade ou não de conceitos para limitação da diversidade dos conteúdos. Assunto pertinente à dialética da CJ.
Notas
1. Veja KANT, I. Fundamentação da Metafísica dos Costumes, III seç., B 123.
2. Veja ARENDT, H. Lições sobre a Filosofia Política de Kant, I liç., p. 15.
3. Veja KANT, I. Observações sobre o Sentimento do Belo e do Sublime, I seç, p. 21.
4. Veja KANT, I. Op. cit., II seç., pp. 26 e 27.
5. Veja KANT, I. Idem, II seç., p. 28.
6. Veja KANT, I. Ibidem, II seç., p. 31.
7. Veja BAUMGARTEN, A.G. Estética, part. I, § 116, part. II, cap. I, seç. IX, § 607, e part. III, cap. I, seç. I, § 14.
8. Veja KANT, I. Crítica da Razão Pura, §24, B 150 e ss.
9. Veja KANT, I. Op. cit., “analítica dos princípios”, B170 e ss.

Bibliografia

ARENDT, H. Lições sobre a Filosofia Política de Kant; trad. André D. de Macedo. – Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993.

BAUMGARTEN, A.G.. Estética; trad. Mirian S. Medeiros. – Petrópolis: Vozes, 1993.
KANT, I. “Observações sobre o Sentimento do Belo e do Sublime”; trad. Vinícius de Figueiredo. – Campinas: Papirus, 1993.

____. Crítica da Razão Pura; trad. Alexandre F. Morujão e Manuela P. dos Santos. – Lisboa: Caloute Gulbenkian, 1989.

____. Fundamentação da Metafísica dos Costumes, in Textos Selecionados; trad. Paulo Quintela. – São Paulo: Abril Cultural, 1980. (Os Pensadores).


Kaquinda Dias

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