O PENSAMENTO KANTIANO E SUA
FILOSOFIA CRÍTICA I
Com este título, queremos
aqui dar uma vista de olhos à Obra de Kant, apresentando as indeias principais
que ele nos deixou, contextualizando-as na história da Filosofia Ocidental. É
extrato de um texto resultante de pesquisas e reflexões que temos feito sobre a
herança filosófica que Kant nos deixou.
Falando de filosofia crítica
kantiana estamos em sua arquitetônica filosófica – as chamadas Críticas
(Crítica da Razão Pura, Crítica dos Costumes e Crítica do Juízo).
Devemos considerar, desde
início que a Obra de Kant, geralmente, é dividida em duas grandes fases, a primeira,
chamada Pré-Crítica, que vai de 1755
a 1770, e a segunda de Criticismo, de
1781 até 1790. Na fase pré-crítica, Kant debate todo tipo de tema, indo desde a
teoria do céu - História Universal da
Natureza e Teoria do Céu, publicado anonimamente em 1755 – até os silogismos
de lógica clássica – Acerca da Falsa Sutileza das Quatro Figuras do Silogismo (1762). Aqui, não há ainda uma organização sistemática
dos conceitos e idéias trabalhados. Mas já podem ser notadas noções que serão mobilizadas
e sistematicamente agrupadas, mais tarde. A partir de sua famosa Dissertação de
70, ou Acerca da Forma e dos Princípios
do Mundo Sensível e do Mundo Inteligível, Kant lança a linha de pesquisa e os
conceitos principais que orientarão o plano arquitetônico de sua fase crítica, ao
mesmo tempo em que conseguia uma almejada colocação na Universidade de Koenigsberg.
Durante os onze anos que se seguiram,
monta então um método de análise das questões metafísicas que só terá seus alicerces
expostos por inteiro na primeira crítica, a Crítica
da Razão Pura (1781, doravante CRP).
Com CRP, fica estabelecida a divisão fundamental das faculdades do pensamento em
três partes: conhecimento, juízo e razão.
O conhecimento da natureza objetiva das coisas é tratado pela própria CRP. A razão
e suas idéias de liberdade e vontade boa são abordadas na Crítica da Razão Prática (1788). À
Crítica da Faculdade de Julgar(1790, doravante CJ), restou o tratamento
dos limites da formação de proposições técnicas e da arte, ao realizarem um fim
na natureza.
Em sua fase crítica, Kant escreveu
vários outros opúsculos – de "O
Que é Esclarecimento?", de 1783, até
Lógica (1800) - que preparavam
a passagem de uma etapa da crítica para outra; divulgava os pontos principais de
seu método; além de debater as disciplinas da história, do direito, política, educação,
religião, antropologia e lógica, sempre sob a ótica do criticismo.
Os textos de Kant diretamente
relacionados com a arte são o opúsculo pré-crítico“Observações sobre o Sentimento
do Belo e do Sublime” (1764) e a Crítica do Juízo (CJ). Porém, a CRP traz definições importantes
acerca do conceito de estética e do papel da imaginação que, se forem ignoradas,
podem gerar interpretações equivocadas em relação à sua concepção de arte. Em Observações, são relacionadas várias
noções, hipóteses e exemplos de sentimentos de gosto e moral. O texto carece de
definições mais precisas. As duas primeiras seções esboçam uma teoria do gosto e
da moral, enquanto as terceira e quarta seções traçam uma visão antropológica dos
caracteres humanos, a qual foi alvo de ataques das feministas, no século XX. Contudo,
sua leitura serve como roteiro inicial dos conceitos e idéias que serão melhor trabalhados
na CJ. São visíveis as influências dos filósofos escoceses, o que lhe valeu a alcunha
de “Hume prussiano”. Em suma, são os projetos de uma futura crítica da razão prática
e do gosto que se encontram ali.
Na "Estética" e na "Lógica
Transcendental", que subdividem a CRP, há uma definição de estética, como
forma da sensibilidade, que difere radicalmente do uso comum do termo lançado por
Baumgarten. Para Kant, os juízos relacionados à arte dizem respeito à faculdade
do juízo e formação do gosto (teoria da arte, como técnica de realização de um fim
da natureza). Por outro lado, a estética kantiana visa definir os limites da sensibilidade
na forma dos conceitos de espaço e tempo, que antecedem a toda experiência sensível.
Além disso, a CRP faz a classificação das faculdades mentais; da imaginação, razão,
entendimento e sensibilidade, bem como as definições conceituais que servem de base
a todo sistema kantiano, incluindo a CJ.
Na CJ, essas classificações reaparecem
ao mesmo tempo em que se busca apontar a finalidade da natureza humana, antecipando
a resposta à pergunta “o que é o homem?”, que só aparecerá publicada na Lógica.
Tal como nas Observações, é um passo para sua antropologia filosófica, mas agora
sistemático e consistente. Aqui, se encontram as limitações de universalização dos
juízos de gosto, em seu lugar sendo postulada, entretanto uma generalização argumentada.
É o famoso conflito entre objetividade e subjetividade que atravessa toda arte moderna.
A solução recairá sobre a tentativa de consenso. Um achado que influenciará Hannah
Arendt (1906-1975) e Juergen
Habermas dois séculos depois. Também é discutido o papel dos interesses
e definidos o belo e o sublime. Por fim, há uma caracterização do gênio artístico
que incendiará as mentes de Hegel e Schopenhauer, forjando todo movimento romântico
do século XIX.
Observações e Primeira Crítica
Embora as Observações sejam consideradas obra da juventude de Kant,
o fato é que seu autor já completava 40 anos na época de sua publicação. A razão
pela qual não se permite incluir os artigos deste período entre os textos maduros
decorre do método rigoroso estabelecido pelo próprio Kant para expor seu pensamento,
após a Dissertação de 70. Por conta
disso, os títulos anteriores a 1770 são geralmente caracterizados como assistemáticos
e carentes de definições mais precisas em vários campos.
Contudo, autores, como Hannah
Arendt, chamam atenção para a importância desses pequenos ensaios iniciais quando
se trata de interpretar os últimos textos da fase crítica ou os temas que só foram
abordados em pormenor no final da vida de Kant, afetada aqui e ali pela senilidade.
As questões ligadas à arte estão entre aquelas atingidas por essas circunstâncias.
Depois das Observações, Kant só
veio trabalhar diretamente o assunto em 1790, com a publicação de CJ, sua terceira
e última grande obra crítica.
As Observações são ainda marcadas pela influência do conceito
de benevolência de David
Hume (1711-1776), bem como todas as teorias sobre o sentimento moral
debatidas desde o lorde e filósofo inglês Anthony Ashley Cooper (terceiro conde
de Shaftesbury, 1671-1713), autor de Investigações sobre a Virtude (1699), até o filósofo e economista escocês
Adam Smith (1723-1790) - Teoria dos
Sentimentos Morais (1759). Kant ainda
se percebia próximo às origens escocesas de sua família, a ponto de ser chamado
de “Hume prussiano” pelo teólogo alemão Johann Georg Hamann (1730-1788), um conterrâneo
seu. Não obstante, na passagem para o criticismo, toda essa presença dos sentimentos
morais será minimizada em função dos ditames da razão. É só no final da Fundamentação da Metafísica dos Costumes (1785) que haverá uma ligeira retomada dos sentimentos
como motivação relevante para moralidade [1], mas que logo se desfaz com o lançamento da Crítica da Razão Prática (1788), onde perdem lugar em definitivo para
o faktum da razão.
Nas Observações, as concepções de arte estão
misturadas com moral, antropologia e mesmo com política – caso se aceite a tentativa
de Arendt resgatar aspectos sociológicos em Kant, desde a fase pré-crítica [2]. Para quem pretende investigar a teoria da arte kantiana, entretanto,
faz-se necessário procurar refinar suas primeiras concepções sobre o tema, a fim
de evitar distorções na leitura posterior dos mesmos conceitos na CJ. Além do mais,
tratam-se de meras observações ou descrições e não de argumentação ou justificação
filosófica.
Ao longo das três críticas, as
faculdades mentais humanas foram sendo criteriosamente classificadas. A CRP procurou
delimitar o alcance da razão, enquanto buscava um fundamento seguro para a produção
do conhecimento racional. A Crítica
da Razão Prática expôs a faculdade
da razão prática e sua capacidade de formular leis que orientassem a ação humana.
Por fim, a CJ visou apresentar o método de subsunção dos conceitos aos fenômenos
e a consequente formação de juízos de avaliação, incluindo o gosto artístico.
Observações de um Filósofo
Logo no primeiro parágrafo do
ensaio de 1764, as sensações de prazer são consideradas atributos próprios dos seres
humanos, um sentimento que lhes seria interno, e nunca o efeito de uma característica
qualquer das coisas externas. Com isso, Kant descartava de imediato toda teoria
das formas platônicas que colocasse a beleza em um mundo harmônico ideal, completamente
independente do sujeito. Porém, ao propor critérios de avaliação de modo subjetivo,
um velho problema ressurge toda vez que se postula valores artísticos objetivos
perante outro sujeito. Só depois de descartadas as soluções sentimentalistas dos
escoceses, um quarto de século mais tarde, é que tentou Kant resolver a questão
da objetividade apelando a uma solução de compromisso pela plausibilidade, através
de um consenso discursivo, na CJ.
Enquanto essa resposta comunicativa
não vinha, a universalização dos valores, em arte, seguiu a sugestão de Francis
Hutcheson (1694-1746), Hume e outros que defendiam sentimentos naturais partilhados
pela maioria da humanidade, sem mais se argumentar em favor de critérios tão subjetivos.
Subjetividade, aliás, que seria uma constante em toda arquitetônica kantiana. Assim,
nas duas primeiras críticas, o fato da racionalidade passará a ser suficiente para
garantir a objetividade do conhecimento e deveres morais impostos pela faculdade
da razão. Já na terceira crítica, por se tratar do gosto, o apelo a uma faculdade
de julgar não será o bastante para apontar um objeto ou juízo valorativo capaz de
ascender a universalização, sem a observância de uma finalidade na natureza (teleologia),
ou pelo menos um consenso argumentado.
Antes de chegar a essa conclusão, nas Observações, Kant expõe apenas o ponto
de vista de um observador comum que se abstém de argumentar como filósofo ao descrever
o sentimento do belo e do sublime. À primeira vista, percebe-se, no entanto, que
os candidatos ao gosto refinado precisam atender a certos requisitos, como, por
exemplo, estar o mais distante possível das inclinações [3]. Os sentimentos do belo e do sublime teriam por função proporcionar
sensações para coisas agradáveis e leves; bem como para objetos imponentes e intensos,
respectivamente. Ou seja, para fruição da beleza e contemplação do sublime. Esses
sentimentos, por sua vez, estariam relacionados a três temperamentos típicos: o
melancólico, o sanguíneo e o colérico, sendo os fleumáticos considerados completamente
destituídos de sentimentos morais.
A partir da segunda seção, o entendimento
é posto ao lado das coisas sublimes, enquanto as habilidades práticas são vinculadas
ao belo. Estas e outras tantas classificações arbitrárias implicariam também na
possibilidade de se considerar belos e sublimes aspectos contraditórios, viciosos
e a fraqueza moral, ressalvadas as deliberações da razão em contrário. Nesses casos,
fica flagrante alguma dose de relativismo nas definições do gosto que Kant não tenta
refutar àquela altura, nem explicar [4]. Mas fica também evidente que uma atribuição superficial do
belo e do sublime pode ser feita sempre que esta for calcada em aparências ou condição
social, nas deliberações sobre o assunto.
Para haver um equilíbrio nas ponderações,
é preciso que se recorra a uma harmonia nas proporções que seja própria à natureza
humana [5]. Nesse sentido, sempre que se seguisse princípios adequados
poder-se-ia chegar ao sublime. Porém, as virtudes que conduzissem ao cumprimento
do dever e à inclusão universal da humanidade seriam pertinentes ao sublime. Surge
aqui, então, a necessidade básica de se encontrar regras restritivas das ações e
das influências das inclinações, no intuito de permitir o florescimento da verdadeira
virtude (amor universal pela humanidade - [6]).
Moral e arte misturam-se em função
da dignidade humana, orientando as escolhas que considerem os interesses de todos.
Tais sentimentos sublimes seriam encontrados em pessoas com caráter melancólico.
Ao passo que, os sanguíneos e os coléricos tenderiam ao belo. Já os fleumáticos
seriam desprovidos de sentimentos refinados.
Em suma, as duas primeiras seções
das Observações mostram, em geral, que, para se alcançar o sublime,
alguns elementos críticos sugeridos são necessários, tais como conexões entre as
sensações e o entendimento, vinculação a princípios, universalização dos interesses,
restrições às inclinações e um projeto da natureza para os seres humanos.
O Conceito de Estética
A sistematização de todas essas
concepções começa a partir da CRP. O plano arquitetônico esboçado por Kant obrigou,
entretanto, que se rejeitasse as iniciativas pioneiras de Alexander G. Baumgarten,
sobretudo no que dissesse respeito ao conceito de estética. Em sua obra monumental Aesthetica (1750/58), Baumgarten havia proposto uma definição
para o termo “estética” como a ciência das coisas sensíveis, incluindo aí a faculdade
de julgar e a possibilidade de se chegar ao aperfeiçoamento do conhecimento sensitivo
[7].
Kant opôs-se a esse projeto e,
na CRP, restringiu o uso do termo “estética” apenas à consideração das formas da
sensibilidade, única parte da crítica do gosto digna de ser considerada científica,
isto é, capaz de contribuir para formação das leis a priori do conhecimento, em geral. Quanto à faculdade
de julgar, ou o Juízo, caberia ainda um lugar de destaque na Crítica, mas a análise
completa dedicada apenas ao gosto só apareceria na publicação da CJ, nove anos mais
tarde.
O objetivo de Kant na primeira
crítica era encontrar uma base sólida para a metafísica, ou do conhecimento filosófico
puro. Kant pensava que a física, a matemática e a geometria de seu tempo já haviam
encontrado formas de conhecimento que satisfizessem seu estatuto científico, enquanto
a metafísica não era capaz de fornecer, sequer, um juízo sintético a priori. Com isso, Kant queria dizer que
para uma atividade ser considerada científica era preciso que esta apresentasse
proposições, ou enunciados, que fornecessem informações adicionais sobre o sujeito
estudado e, além disso, que transcendessem a qualquer experiência, isto é, que fossem
entendidas sem o recurso das relações aparentes das coisas materiais, mas passíveis
de universalização. Tal juízo deveria estar livre do contato com a experiência,
para ser um instrumento preciso da razão humana. A posse de um conhecimento puro
seria importante para qualquer ciência, uma vez que tal conhecimento garantiria
a sua necessidade e fundamentação para suas hipóteses.
Todas as ciências teóricas - a
matemática, geometria e a física -, imaginava Kant, teriam juízos sintéticos a priori como seus princípios fundamentais, caberia agora
à metafísica encontrar seus princípios sintéticos uma vez que ela teria como fonte
apenas o conhecimento puro a priori.
O passo seguinte para solucionar esse problema seria descrever a estrutura da razão
que produz tais juízos. Na "Doutrina
Transcendental dos Elementos", primeira divisão da CRP, Kant apresentou
em primeiro lugar uma "Estética
Transcendental", onde mostrava os princípios da sensibilidade a priori. A sensibilidade, nesse sentido, seria a
capacidade de receber representações dos objetos percebidos. Através da sensibilidade
os objetos são dados e a intuição empírica é fornecida, de acordo com as sensações provocadas
pelos objetos. Os objetos da intuição empírica são chamados fenômenos. Os conceitos relativos aos
fenômenos são gerados pelo entendimento,
tendo por base apenas as intuições da sensibilidade. Além das intuições empíricas,
a sensibilidade forneceria as intuições
puras como formas próprias, não dependentes
de um objeto real dos sentidos, mas a condição para que estes sejam percebidos em
sua figura e duração. Tais intuições puras a
priori seriam o sentido externo do espaço, onde os objetos são representados
como sendo do lado de fora do sujeito, e o sentido interno do tempo que representa dentro do sujeito a sensação
de passagem ou permanência de um objeto. Tempo e espaço não seriam conceitos empíricos,
mas a condição da sensibilidade para que a experiência se tornasse possível, portanto,
antecedendo a esta.
Logo, na Estética Transcendental, a sensibilidade
ocupa um lugar central como a faculdade receptiva das representações em seu contato
com o mundo empírico. Destarte, produziria intuições que depois de serem sintetizadas
pelo entendimento, gerariam conceitos sensíveis ou puros. Quando puras, as intuições
corresponderiam às formas da sensibilidade que abrem passagem para as coisas externas
e internas, por meio do espaço e do tempo, respectivamente. Estes são os principais
conceitos da sensibilidade, existentes antes de qualquer experiência (a priori),
que autorizam conceber a estética transcendental como uma ciência da faculdade representativa,
tal como Kant entendia as ciências, no lugar da estética geral, ou crítica do gosto,
que ele criticava em Baumgarten.
A Faculdade de Julgar
Depois disso, restaria detalhar
como o entendimento produz as representações e o conhecimento daquilo que é percebido
pela sensibilidade. A Lógica Transcendental vem determinar a origem e o alcance desses conhecimentos.
Na estética, Kant concluiu que só é possível ter intuições sensíveis e que as supostas
intuições puras, nada mais são que as formas puras da sensibilidade - espaço e tempo
- que permitem a percepção externa e interna dos objetos. Assim, apoiado em intuições
sensíveis o entendimento deveria pensar os objetos, a fim de gerar o conhecimento,
pela união da intuição com o pensamento. Não obstante, para que fosse um conhecimento
puro conveniente à metafísica, a lógica transcendental deveria analisar também se
existe algum conceito realmente puro e independente da sensibilidade. Caso houvesse,
esse conhecimento oriundo de idéias transcendentais seria o objeto adequado da razão
pura.
A Lógica Transcendental, em resumo, estaria
voltada para o estabelecimento de regras do entendimento e a consequente formação
do conhecimento. Além disso, nesta parte seria feita a análise geral da imaginação
e da faculdade de julgar, em geral, mas que são também pertinentes à teoria da arte.
Ao tratar da imaginação [8], Kant lhe atribui um papel importante, pois, uma vez que o sujeito
atinja a unidade sintética da apercepção – a consciência de si mesmo como um Eu
capaz de garantir objetividade as suas formas de pensamento (categorias de quantidade,
qualidade, relação e modalidade) -, nela seriam formados esquemas dos objetos e
do próprio sujeito consciente que proporcionariam ao juízo relacionar os conceitos
gerados pelo entendimento aos fenômenos. A imaginação poderia fazer representar
os diversos objetos, mesmo sem estes estarem presentes na intuição sensível. O entendimento só seria capaz de fazer a síntese intelectual
do conhecimento a priori. Para fazer
a síntese figurada da diversidade dos objetos seria preciso, então, a participação
da imaginação.
Neste ínterim, a função da faculdade
de julgar estaria em ligar os esquemas da imaginação produtiva com os fenômenos,
subsumindo-os às regras fornecidas pelo entendimento.
Nesta tarefa, o Juízo dependeria tão somente do “bom senso”, uma prática que não
pode ser ensinada, por se tratar de um dom natural de cada um [9]. Graças ao Juízo, o entendimento poderia operar os esquemas
e chegar ao conhecimento fenomenal, relacionando-os, por sua vez, com as categorias
engendradas pelo sentido interno na síntese do sujeito. Por fim, os objetos passariam
a fazer sentido e o universal poderia ser vinculado à experiência, embora o conhecimento
da coisa em si, continuasse sempre inacessível aos humanos.
No restante da CRP, Kant se esforçou
em demonstrar as limitações da razão pura ao estabelecer seus raciocínios e idéias
transcendentais, enquanto tentava expor as dificuldades da mente humana em resolver
os problemas (antinomias) inerentes à existência de objetos simples ou compostos;
às idéias psicológicas, da existência da alma ou de sujeitos absolutos; cosmológicas,
sobre a origem e infinitude do universo; e teológicas, existência de um ser supremo.
Assuntos que não estão diretamente ligados à teoria da arte, mas a do conhecimento.
A antinomia que diz respeito aos juízos estéticos se refere à necessidade ou não
de conceitos para limitação da diversidade dos conteúdos. Assunto pertinente à dialética
da CJ.
Notas
1. Veja KANT, I. Fundamentação da Metafísica dos Costumes,
III seç., B 123.
2. Veja ARENDT, H. Lições sobre a Filosofia Política de Kant,
I liç., p. 15.
3. Veja KANT, I. Observações sobre o Sentimento do Belo e
do Sublime, I seç, p. 21.
4. Veja KANT, I. Op. cit., II seç., pp. 26 e 27.
5. Veja KANT, I. Idem, II seç., p. 28.
6. Veja KANT, I. Ibidem, II seç., p. 31.
7. Veja BAUMGARTEN, A.G. Estética, part. I, § 116, part. II, cap. I, seç. IX, § 607, e part. III, cap. I, seç. I, § 14.
8. Veja KANT, I. Crítica da Razão Pura, §24, B 150 e ss.
9. Veja KANT, I. Op. cit., “analítica dos princípios”,
B170 e ss.
Bibliografia
ARENDT, H. Lições sobre a Filosofia Política de Kant; trad.
André D. de Macedo. – Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993.
BAUMGARTEN, A.G.. Estética; trad. Mirian S. Medeiros. –
Petrópolis: Vozes, 1993.
KANT, I. “Observações sobre o Sentimento do Belo e do Sublime”;
trad. Vinícius de Figueiredo. – Campinas: Papirus, 1993.
____. Crítica da Razão Pura; trad. Alexandre F. Morujão
e Manuela P. dos Santos. – Lisboa: Caloute Gulbenkian, 1989.
____. Fundamentação da Metafísica dos Costumes, in Textos Selecionados;
trad. Paulo Quintela. – São Paulo: Abril Cultural, 1980. (Os Pensadores).
Kaquinda Dias
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